Estaremos na iminência de uma bolha?
Estaremos na iminência de uma bolha?
Os índices bolsistas subiram significativamente nos últimos meses, especialmente desde que ficaram disponíveis as primeiras vacinas da Covid-19. Alguns índices bolsistas, como o S&P500, encontram-se já acima dos valores pré-pandemia, numa altura em que se registam perdas históricas em certos setores, embora também um crescimento inesperado noutros.
Se não fossem os apoios financeiros, estaríamos certamente a viver uma crise financeira bem mais grave. O preço das ações foi, sem sombra de dúvida, influenciado pelos estímulos implementados globalmente, levando os índices a atingir novos máximos históricos em algumas geografias e levando o indicador de preço Price Earnings Ratio (PER) a atingir também valores elevados. Isso significa que estamos na iminência de uma bolha?
O S&P500, o índice mais representativo no portefólio da MyStockIdeas, está a ser transacionado a cerca de 34 vezes os lucros dos últimos 12 meses (PER de 34), um valor consideravelmente superior à média histórica de 16, o que aponta para uma sobrevalorização das ações.
As baixas taxas de juro promovidas pelos bancos centrais têm um papel fundamental em tudo isto. Por um lado, as baixas taxas de juro melhoraram o resultado das avaliações, dado que diminuíram o custo de capital das empresas. Por outro lado, incentivaram os investidores mais conservadores a investir em ações, já que as alternativas, como obrigações corporativas ou outros instrumentos mais seguros, apresentam atualmente taxas de retorno historicamente baixas.
Impacto das taxas de juro nas avaliações
Quando os juros baixam, as empresas conseguem refinanciar as suas dívidas com juros inferiores aos registados no passado, melhorando a sua situação financeira. Nos setores mais endividados esse fator assume maior importância, impactando significativamente no Resultado Líquido das empresas e melhorando as estimativas das avaliações. O impacto é tanto maior quanto mais alargado for o período estimado para a duração das baixas taxas de juro. No presente, existe a espectativa de que as taxas de juro irão permanecer em valores reduzidos durante alguns anos, pelo que o efeito favorável na avaliação das empresas é considerável. Isso faz aumentar a procura por ações, o que se reflete numa subida de preços.
Influência das taxas de juro nos investidores
Devido ao acesso facilitado ao crédito, as obrigações estão a oferecer retornos (yields) historicamente baixos, tornando-as pouco atrativas para os investidores. Por outro lado, existem atualmente diversas empresas cujos dividendos apresentam um retorno superior ao das suas próprias obrigações de dívida. Como tal, para os investidores mais conservadores poderá ser mais apetecível investir em ações de empresas estáveis com bons dividendos do que investir em obrigações. Isso faz aumentar a procura por ações, o que se reflete numa subida de preços.
Influência das taxas de juro no PER
A média histórica do PER de 16 corresponde a um Earnings Yield (inverso do PER) de 6.25%. Isto significa que o retorno esperado pelos investidores relativamente às ações é de 6.25%, em termos históricos. O retorno esperado pelos acionistas varia em função de certas circunstâncias, nomeadamente em função dos retornos que as outras alternativas de investimento oferecem, como as obrigações do tesouro. Caso as obrigações do tesouro oferecessem 6.25% de retorno, os investidores exigiriam uma taxa de retorno superior para investir em ações, de forma a compensar o maior risco associado. Como tal, o retorno total esperado pelos investidores em ações pode ser considerado igual à soma da taxa de juros sem risco com o prémio de risco associado ao investimento em ações.
Sabendo que o prémio de risco histórico é de 3.6% (média dos últimos 30 anos, globalfinancialdata) e sabendo que as taxas de juros sem risco encontram-se atualmente em 0.896% (U.S. 10 Year Treasury), obtemos um retorno esperado de 4.496% (3.6% + 0.896%), ou um PER histórico de 22, e não o PER de 16 referido nos parágrafos anteriores. O PER de 22 corresponde ao mesmo indicador, ajustado às taxas de juro atuais.
Um PER de 34 continua a estar consideravelmente acima de 22, demonstrando que os preços das ações estão elevados face à média histórica.
Considerações finais
A segunda vaga da pandemia veio agravar as consequências económicas e diminuir os lucros das empresas, existindo ainda uma forte possibilidade de vir a ocorrer uma terceira vaga. O PER do S&P500 está elevado, mas, por si só, não deverá alarmar os investidores, uma vez que se espera uma grande recuperação económica para 2021 e, consequentemente, uma descida do PER. Acreditamos que a sustentação dos preços das ações irá depender, sobretudo, de fatores emocionais, relacionados com a continuidade dos estímulos financeiros garantidos pelos estados e bancos centrais e com o progresso dos esforços contra a pandemia. Embora se esperem boas notícias quanto aos estímulos financeiros, a evolução da pandemia é uma incógnita. E os estímulos também têm limites. São dois fatores a ter obrigatoriamente em conta nos próximos meses.