ArcelorMittal (MTL)
Principais resultados da análise
A ArcelorMittal (MTL) é o maior player da indústria siderúrgica global, produzindo atualmente mais de 5% do aço mundial.
Sediada no Luxemburgo, a empresa obtém a maior parte de sua receita da América do Norte e da Europa, representando, em conjunto, cerca de 60% do total de entregas da empresa.
A empresa anunciou em 28/09/2020 que irá alienar as operações da ArcelorMittal USA, numa transação que deverá ficar concluída até ao final do ano de 2020.
Parece-nos que a alienação dos ativos nos EUA será realizada ao justo valor – fazendo uma análise DCF à ArcelorMittal USA chegámos a um valor muito próximo do preço de venda acordado entre as partes – pelo que acreditamos que o valor intrínseco da empresa não será alterado por esta transação.
Fazendo uma análise a dez anos, obtemos um valor intrínseco de $19.54 / ação (16.6 € / ação). Na Bolsa de Madrid, a ArcelorMittal estava a ser transacionada a 12.13 € na última sessão, conferindo um potencial de subida de 27%.
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Empresa
A ArcelorMittal resultou da fusão da Mittal Steel Company e da Arcelor em 2006, duas empresas que cresceram fundamentalmente à custa de aquisições. A MTL tem unidades de produção espalhadas por 18 países e 4 continentes. No final de 2018 a empresa empregava cerca de 191 000 colaboradores.
A MTL vende os seus produtos nos mercados domésticos e através da sua estrutura centralizada para um número diversificado de clientes espalhados por 160 países, incluindo a indústria automóvel, engenharia, indústria dos eletrodomésticos, construção e equipamentos industriais.
A ArcelorMittal dedica-se também à exploração de minas. Em 2019, aproximadamente 52% das suas necessidades de minério de ferro e 12% das suas necessidades de carvão foram suprimidas pelas suas próprias minas. Não obstante, a empresa está exposta à volatilidade associada ao fornecimento e ao preço do minério de ferro e do carvão de coque, uma vez que uma parte importante das suas necessidades depende do fornecimento de terceiros.
Indústria
A indústria do aço e da mineração de ferro e carvão são historicamente cíclicas. Estas indústrias estão dependentes de diversos fatores, entre os quais destacamos as alterações do consumo, as alterações da capacidade global de produção de aço, as alterações das tarifas de importação e os impactos ambientais.
Ao longo da última década é possível identificar vários ciclos (ver figura seguinte), nomeadamente a crise financeira de 2008/2009, assim como as flutuações registadas em 2015 e mais recentemente em 2019.
Em 2015, as quedas das receitas da empresa deveram-se à redução dos preços do aço e do minério de ferro, em parte provocadas pelo aumento do volume de importações nos EUA e na Europa.
Em 2019, as quedas das receitas da empresa deveram-se à conjugação do efeito do aumento do custo do minério de ferro com o efeito da redução dos preços do aço. Estas alterações resultaram, na Europa, de uma menor procura e maior volume de importações, e nos EUA, de uma menor procura, maior capacidade de produção e diminuição dos stocks das empresas distribuidoras.
Alterações das tendências de consumo e da capacidade global de produção de aço
A indústria do aço é, estruturalmente, uma indústria com excesso de capacidade, ie, uma indústria em que a capacidade de produção supera as necessidades de consumo. Como tal, alterações do consumo e da capacidade global de produção de aço podem destabilizar rapidamente o mercado global.
Estas alterações dependem basicamente da tendência da oferta e procura e dos ciclos de inventário. Em termos de oferta e procura, a indústria do aço depende da procura de indústrias cíclicas como a indústria automóvel, da construção, dos eletrodomésticos, máquinas, equipamentos e indústria dos transportes. Em termos de inventário, a indústria do aço é afetada por estratégias generalizadas de acumulação ou libertação de stock. Por exemplo, as empresas distribuidoras podem decidir acumular stock nas alturas em que os preços estão mais baixos, para vender o excesso de stock mais tarde a preços mais atrativos.
As oscilações do consumo e da produção podem ser provocadas, também, por crises internas em países com elevada capacidade de produção:
- A china é o maior produtor e consumidor de aço, por uma larga margem, pelo que o balanço entre a produção e o consumo na china é um fator influenciador dos preços globais do aço. Isso ficou particularmente explícito no ano de 2015, quando um desaceleramento do setor da construção chinês levou a um excesso de oferta na china e a um maior volume de exportações, que acabaria por destabilizar o mercado global e o mercado europeu em particular.
- A crise monetária vivida na Turquia em 2018 provocou uma redução repentina da procura interna e um subsequente aumento do volume de exportações, o que viria a impactar nos preços globais do aço.
Alterações das tarifas de importação
A imposição de tarifas geralmente favorece a produção doméstica em detrimento das importações. No entanto, isso também pode levar a uma diminuição da rentabilidade das empresas já consolidadas, contrariando o efeito benéfico criado pelas tarifas. Este fenómeno aconteceu nos EUA em 2018 e 2019, quando Donald Trump impões um aumento das tarifas do aço. Essa medida motivou a construção de novas unidades produtivas e a reativação de unidades desativadas, o que, aliado a uma estratégia generalizada de redução dos stocks, provocou uma diminuição dos preços do aço, pressionando as margens das empresas já existentes.
Impactos ambientais
A indústria do aço é vulnerável a catástrofes naturais ou desastres ambientais. Em 2019, os preços de referência do minério de ferro aumentaram na sequência de uma disrupção do fornecimento causada pelo colapso da barregam do Brumadinho, no Brasil, e pelo impacto causado por dois ciclones que afetaram uma importante zona mineira na Austrália.
Alienação das operações da ArcelorMittal USA
A ArcelorMittal anunciou no dia 27 de setembro que iria alienar a totalidade das ações da ArcelorMittal USA, por aproximadamente $1,4 B. Cerca de um terço da transação será paga em dinheiro, enquanto que os restantes dois terços serão pagos sob a forma de ações da Cleveland-Cliffs Inc., a empresa compradora.
Esta venda irá melhorar a estrutura de capital da ArcelorMittal, reduzindo cerca de 2.5% da sua dívida total e $3.1B em pensões. Os $500M em dinheiro serão distribuídos aos acionistas por meio de um programa de recompra de ações. A ArcelorMittal mantém ainda parte dos lucros desta antiga subsidiária através de uma participação minoritária de 16% na Cleveland-Cliffs Inc.
A transação deve ficar concluída no quarto trimestre de 2020, sujeita às aprovações regulatórias necessárias.
Como resultado da transação, a ArcelorMittal verá a sua produção de aço na América do Norte reduzir para metade, mas permanecerá como a siderúrgica mais diversificada geograficamente. A empresa manterá a exposição aos EUA por meio de sua joint venture americana Calvert adquirida em 2014, e ativos no Canadá e no México. A ArcelorMittal também participará na expansão de Cleveland-Cliffs por meio de sua participação minoritária.
Vantagem competitiva
Os mercados da América do Norte e da Europa têm um impacto muito grande nas contas da ArcelorMittal, uma vez que são responsáveis, em conjunto, por cerca de 60% das entregas da empresa. Mas a empresa parece ter perdido parte da margem competitiva que tinha nestes dois mercados.
A ArcelorMittal tem registado uma diminuição gradual das receitas no mercado europeu. Efetivamente, o mercado doméstico europeu tem vindo a perder terreno para o mercado de importações – este último mais que duplicou desde 2012 - criando um impacto negativo nas receitas da ArcelorMittal. O mercado europeu é especialmente sensível às diminuições da procura assim como aos picos de oferta provocados pelas importações, motivado pelo excesso da capacidade existente.
No mercado norte-americano, a melhoria das condições económicas registada nos últimos anos e as condições favoráveis à produção doméstica criadas pela imposição de tarifas, levou ao aumento da capacidade interna por via da construção de novas unidades produtivas ou reativação de unidades desativadas. Embora no início o aumento das tarifas domésticas possa ter trazido benefícios para a ArcelorMittal, a médio prazo fez com que aumentasse a competição no mercado doméstico, o que, aliado a uma estratégia generalizada de redução dos stocks, provocou uma diminuição dos preços do aço. De uma forma geral, o caráter global da ArcelorMittal poderá revelar-se prejudicial para a empresa caso o aumento das tarifas se generalize.
Não obstante, acreditamos que a ArcelorMittal beneficie de uma vantagem competitiva resultante do efeito de escala. Por exemplo, a dimensão da ArcelorMittal dá-lhe a possibilidade de investir mais que os seus concorrentes em Research&Development. A empresa gastou cerca de $301M em 2019 no desenvolvimento de atividades de R&D. Em teoria, esse esforço traduz-se numa melhor antecipação das tendências e melhor resposta aos novos desafios da indústria. A ArcelorMittal tem várias iniciativas de R&D a decorrer, das quais se destaca o projeto Lifecycle Analysis, que estuda o impacto ambiental do processo produtivo e que lhe confere uma vantagem competitiva no setor da construção europeu. A empresa também introduziu materiais inovadores com melhores desempenhos no setor automóvel, não só destinados à indústria tradicional como também à indústria dos carros elétricos.
Management
Lakshmi N. Mittal é Chairman and Chief Executive Officer da ArcelorMittal. Lakshmi N. Mittal está envolvido em projetos de filantropia ligados à educação e saúde infantil. É um homem influente, sendo membro do conselho de administração da Goldman Sachs desde 2008. Fundou a Mittal Steel em 1976 e comandou o processo que culminou na criação da Arcelor Mittal em 2006. É apontado como um dos principais responsáveis pela nova configuração da indústria do aço de alcance global.
Um aspeto menos positivo, na nossa opinião, é o facto de ter colocado os seus filhos em cargos importantes dentro da empresa: Aditya Mittal é presidente e Chief Financial Officer da empresa e Vanisha Mittal Bhatia tem um cargo de direção no conselho de administração.
Quando analisamos os últimos 10 anos verificamos que a empresa perdeu algum valor ao longo do tempo, registando uma diminuição do seu capital próprio e do volume de ganhos retidos.
A administração pretende restabelecer uma combinação de dividendos e recompra de ações com base no dinheiro gerado pela empresa, já no próximo ano. Isso mostra que a administração está otimista em relação ao futuro e alinhada com os acionistas. A utilização de $500M (obtidos na transação da ArceloMittal USA) em recompra de ações também dá indicações nesse sentido.
Em maio deste ano Lakshmi N. Mittal tomou medidas decisivas para prevenir a crise atual, por meio de uma oferta combinada de ações ordinárias e notas subordinadas obrigatoriamente conversíveis. O número de ações disponíveis no mercado subiu cerca de 10% com essa medida.
Situação financeira
A ArcelorMittal SA (AM) está bem posicionada para lidar com o impacto da pandemia de coronavírus, apresentando $11,1B em dinheiro e linhas de crédito, contra uma dívida de curto prazo de $3,1B (no final de junho de 2020). Como já referido, a ArcelorMittal tomou algumas medidas importantes para enfrentar a crise do COVID-19.
As consequências económicas da pandemia poderão estender-se para além de 2021, se tivermos em conta os impactos esperados na indústria automóvel e na indústria da construção. Só o tempo dirá se este nível de liquidez é realmente suficiente para fazer face às contingências. No entanto, com a emissão de maio de 2020 ficou demonstrado que a empresa tem o acesso facilitado ao mercado de capitais. Há ainda que somar os efeitos benéficos da alienação dos ativos da ArcelorMittal USA – esta alienação reduzirá as necessidades anuais de caixa da ArcelorMittal em aproximadamente $400M, incluindo capex, contribuições para pensões, entre outros.