Netflix (NFLX)

  • MyStockIdeas
  • Julho 15, 2020

Principais resultados da análise

A MyStockIdeas decidiu estudar a indústria da Televisão, tendo começado por analisar a AMC Networks (análise já publicada), uma das empresas líder do segmento de TV por cabo.

Mas o Streaming tem assumido um papel cada vez mais relevante no mundo do entretenimento, em grande parte devido ao caminho talhado pela surpreendente Netflix.  

A Netflix começou com um negócio de envio de vídeos pelo correio e rapidamente se transformou numa empresa de distribuição de vídeo por Streaming. Mais recentemente, tornou-se na primeira cadeia global de televisão.

Nesta análise decidimos inverter o método de avaliação que tem sido utilizado pela MyStockIdeas. Assim, em vez estimarmos as variáveis-chave para o cálculo do valor intrínseco da empresa, optámos pelo processo inverso, ie, assumimos que o preço atual das ações corresponde ao valor intrínseco da empresa e calculamos, a partir deste, as variáveis-chave que justificam esse valor. Por fim, analisamos a probabilidade deste cenário se concretizar.

Para que o preço atual das ações da Netflix corresponda ao seu valor intrínseco, é necessário que o volume de vendas quase quintuplique até 2029, e que a margem operacional e o retorno do capital alcancem os 25% e os 23% respetivamente.

É um cenário possível. No entanto, mesmo que o futuro seja risonho para a Netflix, dificilmente estas metas serão superadas, pelo que acreditamos que o preço das ações da Netflix tem pouca margem de subida.

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Empresa/Indústria

A Netflix apareceu em 1997, na altura em que a tecnologia VHS começava a ser substituída pelo DVD.​​ A empresa​​ rapidamente​​ assumiu​​ um papel relevante no segmento de​​ VOD (Video on demand) porque​​ estava disposta a pagar taxas consideráveis ​​de licenciamento. O foco da Netflix centrava-se, nessa altura, no mercado de aluguer de​​ filmes - primeiro por correio e mais tarde por Streaming -​​ mas acabaria por transformar-se num negócio de distribuição televisiva,​​ quando passou a ser tecnologicamente viável transmitir​​ um elevado volume de​​ conteúdo de alta qualidade​​ pela internet.​​ 

O negócio televisivo começou lentamente, com a criação de bibliotecas de conteúdo​​ da indústria televisiva que já não se encontrava no ar e cuja transmissão não representava qualquer ameaçada para a indústria. Para os estúdios tradicionais de televisão​​ a Netflix representava uma fonte de vendas adicional, através da qual escoavam produtos que, doutra forma, não produziriam qualquer receita.

No início a Netflix dependia inteiramente dos estúdios para obter o seu conteúdo, direcionando uma grande quantidade de dinheiro para licenças de distribuição. Mas munida de uma capacidade de análise de​​ dados​​ sem precedentes, a empresa rapidamente passou a identificar os conteúdos que mais lhe interessavam, tornando-se mais seletiva nas licenças​​ que​​ adquiria.​​ Os​​ estúdios​​ foram ficando, simultaneamente,​​ mais dependentes desta fonte de receita adicional, tornando a relação entre as partes mais equilibrada.​​ 

Em 2008 a Netflix tinha apenas 10 milhões de subscritores.​​ A​​ empresa deu um​​ salto​​ significativo​​ em 2010,​​ passando​​ para 20 milhões​​ de subscritores.​​ Mas a​​ Netflix continuava a depender dos estúdios para distribuir o seu conteúdo. Tipicamente a empresa só conseguia disponibilizar as séries um ano após terem saído do ar, continuando a não representar qualquer ameaça para a indústria tradicional. No entanto, a sua biblioteca de conteúdos​​ estava​​ disponível a qualquer hora do dia,​​ atraindo os​​ subscritores que procuravam por um serviço menos dependente de uma agenda ou escala de programação. A Netflix começava a disponibilizar uma nova forma de ver televisão, tornando-se na primeira empresa a fornecer um serviço que possibilitava aos subscritores​​ a experiência da televisão sem os submeter a uma programação pré-determinada ou agenda. Os clientes passaram a questionar o que iriam ver, em vez de quando iriam ver.

O crescimento da Netflix tornou-se, entretanto, visível para a indústria tradicional, passando a ser encarada como um concorrente e não apenas como um parceiro comercial, o que viria a interferir na relação que havia entre as partes. Para se tornar competitiva, a empresa precisaria​​ então​​ de​​ começar a​​ produzir o seu próprio conteúdo. Isso terá levado a Netflix a dar o passo seguinte, passando de um mero distribuidor para​​ criador do seu próprio conteúdo.

Figura​​ 1​​ - Evolução do volume de vendas

 

Ao​​ parecer-se​​ mais com um canal de televisão do que​​ com​​ uma empresa de aluguer de filmes,​​ a Netflix adotou as práticas tradicionais da indústria na criação de novos conteúdos, estabelecendo acordos com estúdios em moldes similares às das restantes cadeias televisivas.​​ No entanto, a​​ Netflix​​ queria​​ construir uma​​ biblioteca​​ de conteúdo. Como tal, em vez de recorrer ao método tradicional,​​ em que a empresa assumia parte dos custos de produção permitindo aos estúdios revender mais tarde o produto a terceiros,​​ a Netflix​​ estabeleceu​​ acordos de longa duração,​​ que impediam​​ os estúdios​​ de​​ revender​​ os​​ conteúdos produzidos pela​​ empresa, em troca de mais dinheiro. Esse procedimento​​ resultou num aumento​​ dos custos de​​ produção,​​ que​​ não tiveram, apesar de tudo,​​ qualquer​​ impacto​​ de longo prazo​​ na rentabilidade da empresa​​ (ver figura seguinte).

Figura​​ 2​​ - Evolução dos rácios de rentabilidade

 

Com o​​ passar dos​​ anos,​​ o número de subscritores​​ aumentou significativamente. Apesar de​​ não estar​​ sozinha​​ na distribuição por internet – plataformas como a​​ HBO Go, a​​ Hulu​​ ou a​​ Amazon​​ Vídeo​​ passaram a​​ distribuir​​ conteúdo televisivo pela internet​​ desde muito cedo​​ –​​ a Netflix continuava, de longe, a​​ ser a​​ maior ameaça para a indústria tradicional.

No primeiro trimestre de 2020 a Netflix alcançou a meta dos​​ 183 milhões de​​ subscritores,​​ beneficiando do período de confinamento imposto pela pandemia do COVID-19. Com estes números​​ impressionantes, a Netflix​​ vincou​​ a sua​​ liderança no processo de transformação do setor da televisão.

 

Vantagem competitiva

A Netflix presta um serviço que se diferencia do setor tradicional em três​​ vertentes: o conteúdo está disponível quando o cliente quer;​​ o​​ conteúdo é disponibilizado sem​​ publicidade; o canal tem​​ um​​ alcance global.

Acreditamos que estes​​ fatores​​ atribuem uma vantagem competitiva​​ à Netflix,​​ face à indústria tradicional. No entanto, o setor já começou a reagir, criando várias soluções concorrentes. Deste conjunto de soluções,​​ destacam-se as empresas de​​ Streaming​​ que algumas​​ cadeias de televisão já lançaram, ou que irão lançar em breve, como o caso da​​ Disney​​ ou da​​ WarnerMedia.​​ 

Mas a empresa goza também de um efeito de escala associado ao número de subscritores. Isso permite-lhe investir em mais e melhor conteúdo, distribuindo os custos por um maior número de clientes. Permite-lhe também identificar os conteúdos mais apropriados, aproveitando-se da sua base de dados alargada​​ de clientes​​ e de algoritmos desenvolvidos internamente, criados para esse efeito.​​ Esse efeito de escala permite que a empresa esteja um passo à frente dos seus concorrentes, criando um ciclo virtuoso​​ onde​​ melhor conteúdo atrai mais clientes, que geram mais receita, que é utilizada para​​ produzir melhor conteúdo.

A evolução da margem bruta (ver imagem seguinte) revela uma tendência positiva desde 2013, o que poderá estar relacionado precisamente com o efeito de escala​​ de que a empresa goza.

Figura​​ 3​​ - Evolução do Gross Profit Margin

 

 

Management

Reed Hastings​​ é o conhecido​​ fundador e​​ CEO da Netflix, o visionário que concebeu e acreditou no​​ modelo de negócios inovador​​ da empresa.​​ 

Hastings​​ tem o mérito de ter transformado um negócio de aluguer de DVD numa poderosa cadeira global de transmissão televisiva. No entanto, alguns​​ analistas​​ questionam a capacidade de liderança​​ de​​ Hastings​​ por causa do caso​​ Qwikster,​​ um plano​​ que contemplava o​​ rebrand​​ e separação da área de negócio de DVD e que viria a ser​​ cancelado​​ devido à pressão dos acionistas.

Mas não restam dúvidas de que a​​ dimensão que a Netflix alcançou e a revolução que a empresa provocou na indústria da televisão em muito se deve a​​ Reed​​ Hastings.​​ No entanto,​​ a história prova que nem sempre​​ são​​ os revolucionários​​ a reinar na​​ nova​​ realidade que criaram.​​ 

 

Situação financeira

O Balanço da Netflix não é dos mais robustos. Como se pode constatar na figura seguinte, os rácios de liquidez e solvabilidade estão abaixo dos limites convencionais​​ (abaixo de um e abaixo de dois respetivamente)​​ e têm vindo a piorar ao longo do tempo.​​ 

Figura​​ 4​​ - Rácios de liquidez e solvência

 

Em termos de financiamento, a Netflix apesenta um perfil de algum risco, uma vez que o indicador​​ debt-to-equity ratio​​ assume valores superiores a 1.​​ A​​ empresa pode financiar-se recorrendo a dívida ou ao seu próprio capital (que inclui o dinheiro aplicado pelos acionistas e os lucros acumulados). Quando uma empresa recorre​​ mais à​​ dívida​​ do que ao capital próprio​​ para se financiar​​ -​​ debt-to-equity ratio​​ superior a 1​​ -​​ apresenta um perfil de maior risco para o investidor.​​ 

Figura​​ 5​​ - Debt-to-Equity Ratio

 

O​​ indicador​​ debt-to-equity ratio​​ pode ser distorcido por ganhos ou perdas retidas, ativos intangíveis e custos associados aos planos de pensões, pelo que poderá não ser suficiente para se compreender a verdadeira alavancagem de uma empresa.

Como alternativa, podemos​​ comparar​​ os juros de empréstimos pagos pela empresa​​ com​​ o​​ Resultado Operacional.​​ Valores inferiores a 35% neste indicador colocam a Netflix num patamar médio de endividamento.

Figura​​ 6​​ - Evolução dos juros (% do Resultado Operacional)

 

 

Avaliação​​ e​​ Key Indicators

A entrada da Netflix numa indústria extremamente competitiva, com décadas de existência, e as mudanças significativas que impôs aos seus intervenientes tradicionais, é um feito extraordinário que ficará nos anais da história. Ironicamente, a​​ empresa utiliza as mesmas infraestruturas da indústria tradicional para distribuir o seu conteúdo (cabo), mas a forma inovadora como o faz permitiu contornar as barreiras de entrada de uma indústria bem estabelecida.

Por mais inspiradora que seja a história da Netflix, as árvores não crescem até ao céu, pelo que até uma empresa como esta tem um valor limite.​​ ​​ O indicador​​ Price/Book Value​​ apresenta um​​ dos valores mais altos que temos visto nas nossas análises, o que​​ é um indício​​ de que a empresa está sobrevalorizada.

Figura​​ 7​​ - Evolução do Price to Book Value

 

Existem poucas referências no setor do​​ Streaming, pelo que estimar os futuros cash-flows da Netflix apresenta uma dificuldade acrescida. Como tal, neste caso particular​​ decidimos inverter o método de avaliação​​ que tem sido utilizado pela MyStockIdeas.​​ Assim, em vez estimarmos as variáveis-chave para o cálculo do valor intrínseco da empresa, optámos pelo processo inverso, ie, assumimos que o preço atual das ações corresponde ao valor intrínseco da empresa e calculamos, a partir deste, as variáveis-chave que corroboram este valor. Por fim, analisamos a probabilidade deste cenário se concretizar.

Para chegar ao preço atual das ações da Netflix​​ ​​ $524 em 14 de julho de 2020 – considerámos​​ que o​​ volume de vendas irá manter a sua tendência de grande crescimento nos próximos anos,​​ decaindo gradualmente até​​ estabilizar nos 5% no ano 10.​​ Este crescimento dependerá da capacidade da Netflix​​ em​​ manter o papel de liderança no​​ Streaming​​ e de se​​ tornar ainda mais​​ global.​​ 

Considerámos também que a​​ Margem Operacional antes de impostos crescerá gradualmente ao longo dos anos, até atingir os 25% no ano 10, refletindo o aumento do preço das​​ subscrições e as vantagens provenientes do efeito de escala.

Considerámos​​ ainda​​ que o rácio​​ capital turnover​​ descerá​​ ligeiramente​​ (será preciso mais investimento para manter igual volume de vendas), refletindo​​ o aumento​​ da concorrência.​​ Com tudo isto, o​​ ROC​​ atinge​​ os 23% no ano 10.​​ 

Para se chegar ao preço atual das ações da Netflix é então necessário que o volume de vendas quase quintuplique até 2029,​​ e​​ que a margem operacional​​ e o retorno do capital melhorem​​ significativamente​​ ao longo dos próximos 10 anos.​​ 

Algumas empresas dominantes do setor tradicional apresentam margens​​ operacionais​​ e​​ retornos semelhantes aos​​ considerados​​ neste cenário hipotético, pelo que não​​ é descabido​​ que a Netflix venha a atingir estas metas.​​ Tendo em conta o mercado​​ ainda por explorar​​ pelo​​ Streaming​​ e o​​ Pricing​​ Power​​ que uma empresa dominante como a Netflix tem, não será também impossível que o volume de vendas quintuplique nos próximos 10 anos.

No entanto, o difícil será superar estas metas. Por conseguinte,​​ consideramos que o preço das ações da Netflix tem pouca margem de subida.​​ Interessa ressalvar que, sendo a Netflix uma empresa tão popular, certamente que a especulação terá​​ um​​ impacto​​ importante​​ no preço das suas ações, mas essa é uma matéria que extrapola o domínio da MyStockIdeas.​​ 

 

 

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