Farfetch Ltd (FTCH)
Principais resultados da análise
A evolução do volume de vendas da Farfetch é notável, tendo passado de 128M€ em 2015 para 754M€ entre julho de 2018 e junho de 2019 (TTM). No entanto, esse crescimento tem-se traduzido também num agravamento dos prejuízos operacionais da empresa.
Projetando-se as estimativas da MyStockIdeas numa análise cash-flow, verifica-se que a empresa necessitará de um capital adicional de 1.535 M€ ao longo dos próximos anos, para suportar o seu crescimento. Assumindo que a Farfetch emitirá dívida num montante equivalente a 26% do total de capital investido até 2028 (média da indústria), faltarão cerca de 1.000 M€ de financiamento para completar os 1.535 M€ atrás mencionados, o que deverá ser obtido através de emissão de ações. Interessa realçar que um cenário real de emissão de ações não afeta a avaliação resultante da análise cash-flow, já que o efeito de diliuição das ações está já subentendido nos valores negativos de Free Cash Flow to Firm considerados no modelo.
O valor das ações obtidos na análise Cash-Flow é de 11.18 €, recomendando-se a compra de ações até 10.06€ (margem de segurança de 10%).
É de notar que existe o risco de perda total do investimento nas Start-Ups, pelo que se trata de um investimento de alto risco. No entanto, existente também um retorno elevado no cenário mais favorável. E ainda, por se tratar da primeira empresa com ADN português a fazer um IPO numa das mais reconhecidas bolsas do mundo, a Farfetch merece um voto de confiança adicional.
Ver análise detalhada
Introdução
Nesta avaliação será efetuada uma análise assente no histórico dos dados financeiros e dos principais indicadores de desempenho, o que permitirá obter uma boa aproximação do valor da empresa. A avaliação é baseada na informação disponível nos relatórios e contas, em estudos publicados, em artigos disponíveis na imprensa, legislação, etc.
Os dados financeiros das empresas aparecem resumidos em três tipos de formatos: demonstração de resultados, balanço e o fluxo de caixa.
A demonstração de resultados apresenta a quantia que a empresa faturou num determinado período de tempo (vendas) e a quantia que utilizou para obter essas receitas durante o mesmo período de tempo (custos). Analisando a demonstração de resultados podemos verificar se as receitas estão numa tendência crescente ou decrescente, se as despesas estão em linha com as receitas, se os lucros são consistentes ou voláteis, se apresentam um padrão cíclico, entre outros. Os preços das ações da grande maioria das empresas estão relacionados com os lucros, pelo que a análise da demonstração de resultados assume uma grande importância no processo de previsão do preço das ações.
A estrutura de balanço reflete a condição financeira da empresa em determinado instante. Através do balanço é possível verificar a solvência da empresa, a sua liquidez, a sua eficiência operacional, entre outras características. Um balanço forte pode ser um indicador de resistência a ciclos económicos adversos.
O fluxo de caixa reflete o dinheiro que realmente entrou e saiu da empresa durante um determinado período de tempo (tipicamente 1 ano). O histórico do fluxo de caixa permite saber a quantia que a empresa realmente gasta e que efetivamente recebe, fornecendo informação indispensável para o cálculo do seu valor intrínseco.
Ao longo desta análise será interpretada a informação disponibilizada por estes três formatos e, recorrendo a indicadores-chave, será calculada uma primeira estimativa do valor da empresa.
Descrição da empresa
A Farfetch é uma plataforma global de distribuição on-line de produtos de luxo pessoais, fundada em 2008 por José Neves, que permanece CEO e um dos principais acionistas. A plataforma liga clientes e vendedores de marcas de luxo e oferece uma ampla seleção de produtos aos consumidores.
O número de clientes da Farfetch corresponde, atualmente, a cerca de 4% do segmento de produtos de luxo on-line e menos de 0,5% do total da indústria de bens de luxo. Para os próximos anos é esperado um forte crescimento das compras online de luxo e a Farfetch está bem posicionada para poder lucrar com esse crescimento.
As comissões cobradas pela Farfetch às marcas e grossitas são elevadas face a outras plataformas de e-commerce, o que é um sinal do valor que estas entidades atribuem à plataforma. Embora este tipo de contratos seja renovado anualmente, a empresa conseguiu reter quase todos os seus 100 principais fornecedores ao longo dos últimos 3 anos, segundo a Farfetch.
A empresa cresceu de 35 parceiros em 2009 para cerca de 1000 parceiros, entre marcas e fornecedores grossistas, de 45 países diferentes. Atualmente, o crescimento da plataforma é impulsionado principalmente pela atração de novos clientes, tendo o número de clientes ativos passado de 416 mil em 2015 para mais de 1 milhão em 2018.
A Farfetch pode ser caracterizada como uma típica Star-Up, apresentando um forte crescimento do volume de vendas em simultâneo com um crescimento dos prejuízos. As Start-Ups apresentam alguns pontos em comum, nomeadamente:
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Reduzido histórico de informação financeira;
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Resultados Operacionais negativos;
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Ações com reduzida liquidez;
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Principais acionistas com direitos especiais sobre as ações (de voto, etc.);
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Taxa de sobrevivência abaixo de 50%;
É difícil estimar futuros cash-flow para as Start-Ups, ainda mais quando está em causa a própria sobrevivência da empresa. Como consequência, muitos investidores preferem não correr o risco de avaliar estas jovens empresas, abrindo uma janela de oportunidade para quem as avalia.
Dado o estágio inicial em que se encontra, o investimento em ações da Farfetch tem uma incerteza muito alta associada.
Figura 1 - as fases iniciais do ciclo de vida de uma empresa (Damodaran, 2011)
Situação financeira
Análise dos resultados
O volume de vendas é o primeiro dado a analisar na demonstração de resultados. As vendas são a força vital das empresas. Sem elas não há lucro ou qualquer perspetiva de negócio. A análise do histórico do volume de vendas permite avaliar a exposição da empresa aos ciclos económicos e perceber se o negócio está em expansão ou em retração.
A evolução do volume de vendas da Farfetch é notável, tendo passado de 128M€ em 2015 para 525M€ em 2018 e 754M€ de julho-18 a junho-19 (TTM). No entanto, esse crescimento tem-se traduzido também num agravamento dos prejuízos operacionais da empresa.
Figura 2 – principais dados da demostração de resultados
O resultado operacional reflete a capacidade que a empresa tem de gerar receita. Tal como o nome indica, este dado mostra o resultado gerado exclusivamente pelas operações do negócio, antes de ser descontada a verba destinada ao pagamento de juros e impostos. Dado que o resultado não é distorcido pelo nível de endividamento em que diferentes indústrias operam ou pelas taxas tributárias que diferem de país para país, o resultado operacional é um indicador particularmente útil quando se pretende comparar diferentes empresas.
O resultado líquido da empresa reflete essencialmente a evolução do Resultado Operacional. O resultado líquido tem-se mantido negativo desde o início, e o seu valor tem evoluído negativamente e na mesma proporção do volume de vendas (Figura 4). Isto significa que a FTCH ainda não conseguiu alterar as margens de lucro negativas que caracterizam o seu negócio desde o início.
Figura 3 – Evolução do Resultado Operacional
Figura 4 – Taxa de crescimento das vendas e prejuízos
O Resultado Operacional corresponde ao somatório de diversas parcelas, das quais se destacam as seguintes (Figura 5):
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Gross Profit, ou margem bruta: é um indicador que revela a quantidade de dinheiro disponível das vendas após dedução do custo dos produtos vendidos. A margem de lucro bruto geralmente aparece expressa como uma percentagem das vendas.
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Selling, General and Administrative Expenses (SG&A): inclui todas as despesas gerais e administrativas incorridas durante o período contabilístico. Estas incluem salários de gestão, publicidade, custos de representatividade, honorários, comissões, entre outros.
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Depreciação e Amortização: é uma rubrica onde se reconhece o desgaste que as máquinas e edifícios vão apresentando ao longo do tempo.
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Outros ganhos/custos operacionais: inclui receitas de todas as outras atividades operacionais que não estão relacionadas com as principais atividades da empresa, como ganhos / perdas em alienações, receita de juros, receita de dividendos, etc.
Analisando as principais componentes do resultado operacional da Farfetch, constata-se que o Gross Profit e as SG&A são as parcelas que apresentam maior peso.
Figura 5 – Componentes do Resultado Operacional
A análise do histórico destas componentes revela uma diminuição da Gross Profit Margin e um aumento dos custos de SG&A relativamente ao Gross Profit.
Segundo a Farfetch, a diminuição da Gross Profit Margin deveu-se ao aumento dos custos associados ao serviço de despacho dos produtos e à diminuição da margem das vendas do tipo “first-party” (situação em que a Farfetch atua como retalho e a marca como fornecedor grossista). O aumento dos custos de SG&A reflete um aumento do número de colaboradores, das despesas de tecnologia e despesas de marketing.
Figura 6 – Gross Profit Margin e SG&A
O resultado não operacional (Figura 2, Non-Operating Income/Expenses, Total) deve-se, geralmente, a eventos não recorrentes, pelo que muitos investidores optam por não os considerar no processo de avaliação de uma empresa.
O resultado não operacional teve um impacto positivo de 17M€ (Figura 7 e Figura 8). Este valor está relacionado exclusivamente com operações financeiras da empresa, nomeadamente com ganhos não realizados e ganhos com juros realizados em investimentos de curto prazo. Ao longo dos próximos anos o resultado operacional deverá ter pouco significado no resultado líquido da empresa, ainda que se espere alguma volatilidade associado a esta componente.
Figura 7 – Componentes do resultado Líquido
Figura 8 – Evolução do resultado não operacional
A exposição à dívida e os gastos de capital podem ser analisados de uma forma indireta na demonstração de resultados, através da observação dos juros pagos pela empresa e do valor assumido em amortizações e depreciações.
Embora a depreciação não represente um custo real, não se pode ignorar que o envelhecimento e natural degradação dos ativos obrigará a empresa, um dia, a adquirir novos equipamentos. Como tal, a depreciação é um gasto bem real e deve sempre ser considerada na análise de uma empresa. As empresas com menores valores de depreciação em relação ao Gross Profit geralmente são mais competitivas.
Atualmente a Farfetch não tem dívida no seu balanço.
Os custos de depreciação face ao Gross Profit têm vindo a diminuir ao longo dos anos, encontrando-se atualmente nos 5,6%, um valor baixo. É de notar que alguns custos SG&A poderiam eventualmente ser capitalizados em termos contabilísticos, diminuindo a parcela de SG&A e aumentando a rúbrica da depreciação. Tal refere-se a parte das despesas de tecnologia e marketing que, tratando-se de investimentos que produzem resultados a longo prazo, os respetivos custos poderiam ser capitalizados, isto é, depreciados a longo prazo também.
Figura 9-Evolução da depreciação em função do Gross Profit
Estrutura do balanço
No balanço começamos por analisar os ativos mais líquidos, nomeadamente a quantidade de dinheiro disponível. Quando existe muito dinheiro disponível em relação ao preço de mercado dos títulos, é um sinal positivo. Nesse caso, as ações podem valer mais do que o resultado líquido indica, sendo provável que os acionistas venham a beneficiar desses ativos por meio de dividendos ou através de lucros gerados pela aplicação desse dinheiro em investimentos adequados. Muito dinheiro disponível indica uma de duas coisas: a empresa tem uma vantagem competitiva que se está a traduzir em ganhos financeiros, o que é positivo, ou a empresa vendeu parte dos seus ativos ou ações, o que não é tão positivo.
Um investidor de renome, Joel Greenblatt, utiliza um simples cálculo para aferir o dinheiro em excesso existente na empresa. Assume que uma empresa necessita de 20% do volume de vendas para conduzir o seu negócio, sendo o restante considerado dinheiro em excesso.
As Start-Ups precisam de muito dinheiro em caixa, de forma a poderem cobrir os prejuízos que estão associados às fortes taxas de crescimento dos primeiros anos de vida. Como tal, a análise desta rubrica assume contornos um pouco diferentes da análise de uma empresa madura - o dinheiro em caixa e a relação com os investimentos previstos será abordada com mais detalhe no ponto relativo à avaliação.
A rubrica goodwill também merece ser analisada. O aumento de goodwill geralmente está relacionado com a aquisição de novos negócios.
A Farfetch apresenta um valor estável e pouco significativo de Goodwill no seu balanço, de 31 M€, correspondendo a cerca de 3% do valor total dos ativos. Juntando outros ativos intangíveis (ativos que não existem fisicamente, como patentes, direitos de autor, nomes de marcas, etc.) o seu peso corresponde aproximadamente a 10% do valor total dos ativos.
Empresas muito endividadas estão mais expostas a ciclos económicos desfavoráveis, como uma recessão. Como regra, as empresas com uma vantagem competitiva durável exibem pouca ou nenhuma dívida de longo prazo. Em empresas com dívida no balanço deve ser analisado o respetivo histórico e verificada a tendência registada nos últimos anos.
A Farfetch não apresenta dívidas no seu balanço. Não obstante, a empresa deverá recorrer à dívida no futuro, como meio de financiamento do seu crescimento. Esta questão será analisada com mais detalha no ponto relativo à avaliação.
Numa das suas últimas entrevistas, Ben Graham, o pai da análise fundamental, informou que usava um critério simples para medir a solvência de uma empresa. Uma empresa deve possuir o dobro do que deve. Por outras palavras, o rácio Total Assets / Total Liabilities deve ser maior ou igual a 2.
A Farfetch registou um rácio de 6 em 2018, cumprindo com o critério de solvência de Ben Graham. Na Figura 10 constata-se que o indicador Current Ratio – ativos de curto prazo menos passivos de curto prazo – apresenta valores de igual grandeza, uma vez que o volume total de ativos (correntes e não correntes) é quase todo constituído por ativos correntes.
Como já referido, é normal que as Start-Ups apresentem rácios desta grandeza logo após a IPO (a IPO da Farfetch ocorreu em 2018), mas é inevitável que este rácio venha a diminuir ao longo dos próximos anos, tendo em consideração que os resultados negativos irão permanecer por uns anos e que a empresa deverá recorrer, a seu tempo, ao crédito.
Figura 10 – relação dos ativos e passivos
A relação da dívida com o património líquido pode ser utilizada para perceber o modo como a empresa se financia. Basicamente a empresa pode financiar-se recorrendo a dívida ou ao seu próprio capital (que inclui o dinheiro aplicado pelos acionistas e os lucros acumulados). Quando uma empresa recorre constantemente a dívida para se financiar, apresenta um perfil de maior risco para o investidor.
Como já indicado nesta análise, a Farfetch não apresenta dívida no seu balanço. No entanto, será muito provável que a empresa recorra à dívida nos próximos anos. Esta situação será analisada com maior detalhe no ponto relativo à avaliação.
Para medir o retorno do capital investido na empresa destacamos 3 indicadores: Return on Equity, Return on Capital Employed, e Return on Acess. O enfoque num ou noutro indicador varia conforme o tipo de análise que pretendemos fazer.
No Return on Capital Employed (ROCE) compara-se o resultado operacional com o capital investido na empresa. Um ROCE de 20% significa que por cada euro investido, a empresa obteve 20 cêntimos de lucro operacional. Consideramos que este indicador é o mais adequado para efeito de benchmarking com outras entidades, já que permite uma compararão dos resultados antes dos juros e impostos, fatores estes que variam entre indústrias ou países e que distorceriam os resultados.
A análise destes indicadores não apresenta grande utilidade na fase de maturação em que a Farfetch se encontra. Para além do histórico de informação ser reduzido, a empresa só entrou na bolsa em 2018 e o resultado destes indicadores é impactado por essa ocorrência.
Existem várias formas possíveis de analisar o preço das ações face ao seu histórico, destacando-se o Current Earnings Yield. Este indicador permite comparar o preço atual com os preços verificados no passado ou com os preços da concorrência e identificar se este está relativamente alto ou baixo. O Current Earnings Yield compara o resultado operacional com o valor pelo qual o mercado avalia a empresa (Enterprise Value).
Se a este indicador juntamos o ROCE, referido no parágrafo anterior, ficaremos com uma relação do preço e do retorno do investimento que a empresa apresenta. Uma empresa com um preço baixo e retorno elevado será uma melhor aposta que uma empresa nas condições opostas.
No caso da Farfetch, não podemos utilizar estes indicadores na avaliação do preço das ações, dado que não existe histórico de informação suficiente e porque os resultados finaceiros são negativos. Por conseguinte, a avaliação do preço das ações será efetuada exclusivamente com base na avaliação dos futuros cash-flows.
O lucro por ação é a medida mais importante na determinação do valor da empresa.
Dado que a recompra de ações se traduz numa diminuição do número de ações em circulação, esta ocorrência provoca um aumento imediato do lucro por ação. Normalmente a recompra de ações surge num contexto em que as ações estão subvalorizadas, representando, neste caso, uma forma de agregar valor à empresa.
Por outro lado, a emissão de ações diminui o lucro por ação de uma forma imediata, destruindo valor para os acionistas. As empresas recorrem a esta forma de financiamento quando não têm reservas de dinheiro suficientes para fazer face aos seus investimentos ou quando as taxas de juro (custo dos empréstimos) são muito elevadas.
É sempre importante observar o histórico do número de ações emitidas para confirmar a política que a empresa segue em relação a esta matéria.
As Start-Ups geralmente apresentam cash-flow negativos na fase inicial de vida, não gerando retorno efetivo aos acionistas. Devido à necessidade permanente de investir no seu próprio crescimento, muitas vezes acontece o contrário, isto é, os acionistas são chamados a investir na empresa para manter o seu nível de crescimento.
Como registado nesta avaliação, a Farfetch entrou em bolsa em 2018. No entanto, existe a possibilidade de a empresa recorrer novamente à emissão de ações para se financiar. Esta situação será detalhada no ponto relativo à avaliação da empresa.
O indicador Price/Book Value pode ser utilizado para comparar valores de empresas similares do mesmo setor, que seguem o mesmo método contabilístico para avaliação de ativos.
O indicador não deve servir como base de comparação entre empresas de diferentes setores e indústrias, devido a diferenças nos critérios contabilísticos. Por exemplo, algumas empresas podem registar os seus ativos ao custo histórico de aquisição enquanto outras podem registar os seus ativos ao valor atual do mercado.
Como resultado, um valor alto neste indicador não significará necessariamente que a empresa esteja sobreavaliada, assim como o inverso não quererá dizer que a empresa esteja subavaliada. No entanto, pode ser um indicador útil quando utilizado para comparar empresas do mesmo setor.
Como se pode observar na figura seguinte, o indicador Price/Book Value apresentou uma descida nos últimos 12 meses relativamente a 2018. Esta descida está relacionada com a forte diminuição dos preços das ações da Farfetch, que foi motivada principalmente pelas estimativas menos otimistas apresentadas pela empresa em agosto de 2019. Além dos resultados e estimativas para o terceiro trimestre, a Farfetch também anunciou a aquisição da New Guards, uma plataforma que permite à empresa reforçar no "streetwear", o que parece não ter sido bem recebido pelos investidores. A imagem da Farfetch foi também afetada pela saída do chief operational office (COO) Andrew Robb, após 9 anos de colaboração com a companhia.
Figura 11 – Evolução do indicador Price/Book Value
Fluxo de caixa
O Free Cash Flow Yield é um indicador que compara o fluxo de caixa operacional – somatório do dinheiro recebido e dinheiro gasto nas operações - com o valor de mercado da empresa. Este indicador representa uma alternativa à métrica earnings yield já mencionado nesta análise, na medida em que permite comparar o preço atual dos títulos com os preços verificados no passado ou com os preços da concorrência e identificar se este está relativamente alto ou baixo.
Analisando o histórico deste indicador verifica-se que o Free Cash Flow Yield apresentou uma melhoria em 2019, não só porque o preço das ações desceu, o que significa que o valor de mercado da Farfetch desceu, mas também porque a empresa conseguiu manter o nível de cash-flow operacional do ano anterior (2018). No gráfico seguinte pode-se observar que o cash-flow operacional interrompeu a sua tendência de diminuição em 2019 (TTM), apesar do crescimento verificado no volume de vendas.
Figura 12 – Taxa de crescimento das Vendas, do Cash Flow Operacional e das Despesas de Capital
Os gastos de capital têm uma influência direta na determinação do Free Cash-Flow to Equity, isto é, na determinação da quantidade de dinheiro que fica efetivamente disponível para os acionistas. Se os requisitos de gastos de capital forem permanentemente altos, significa que a empresa precisa de reinvestir uma grande parte das suas receitas de uma forma continuada para poder manter os ativos existentes. Elevadas despesas de capital reduzem o fluxo de caixa, no qual se baseia o valor de uma empresa. Empresas com elevados gastos de capital apresentam rácios do indicador Capital expenditure/sales superiores a 20%.
Analisando a Figura 13, verifica-se que as despesas de capital têm aumentado gradualmente, mas permanecem num nível baixo.
Figura 13 - Capital Expanditures / Sales
Avaliação
O processo de avaliação de uma empresa não é um exercício objetivo, sendo influenciado por vários fatores como a falta de informação, erros associados às estimativas, erros relacionados com preconceitos do próprio analista, entre outros. No entanto, é um método que permite uma boa aproximação do valor das empresas e, acima de tudo, permite identificar os melhores negócios quando utilizado de forma consistente e uniforme em todas as empresas.
Para estimar o valor intrínseco da empresa começa-se por calcular o dinheiro que está efetivamente disponível para os acionistas, o Free Cash Flows to Equity (FCFE). Este indicador corresponde ao fluxo de caixa resultante após cumpridas as obrigações financeiras, assumidas as despesas de capital e depois de satisfeitas as necessidades de capital circulante.
Depois de calculado o FCFE, o passo seguinte consiste em estimar a taxa de crescimento da empresa. Os relatórios financeiros são uma fonte de informação imprescindível para esta etapa. Também é importante identificar a fase do ciclo económico que se atravessa, entender as perspetivas da indústria onde a empresa se insere, conhecer as empresas concorrentes, identificar as vantagens competitivas da empresa, e todos os outros fatores que influenciam o crescimento do negócio.
Integrando essas variáveis numa análise de Cash-Flow, obtém-se finalmente o preço a que a ação deve ser adquirida para ir de encontro às espectativas de retorno do investidor.
Nos pontos seguintes resumem-se os principais resultados desta análise:
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A evolução do volume de vendas da Farfetch é notável, tendo passado de 128M€ em 2015 para 525M€ em 2018 e 754M€ entre julho de 2018 e junho de 2019 (TTM). No entanto, esse crescimento tem-se traduzido também num agravamento dos prejuízos operacionais da empresa;
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A empresa revela uma diminuição do Gross Profit Margin e um aumento dos custos de SG&A relativamente ao Gross Profit, impactando negativamente no resultado operacional.
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A Farfetch não apresenta dívida no seu balanço. No entanto, será muito provável que a empresa recorra à dívida nos próximos anos;
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O Free Cash Flow Yield apresentou uma melhoria em 2019, não só porque o preço das ações desceu (o valor de mercado da Farfetch desceu) mas também porque a empresa conseguiu manter o nível de cash-flow operacional do ano anterior (2018).
Existem três fatores chave para a estimativa dos futuros cash-flow de uma start-up.
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O primeiro é a taxa de crescimento das vendas, que pode ser obtida extrapolando os valores registados no passado ou estimando a cota de mercado que ficará reservada à empresa na fase de maturidade. Nesta avaliação, para os próximos 10 anos estimamos que o mercado global de bens de luxo crescerá 1.5% ao ano (cresceu 6% ao ano desde 2010) e que o mercado online crescerá 13.5% ao ano (cresceu 27% ao ano desde 2010). Estimamos também que a Farfetech terá, em 2018, uma cota de mercado equivalente a 2% do volume total do mercado e a 6% das vendas online.
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Outro fator chave será estimar os custos operacionais que irão suportar o crescimento estimado para as vendas. Como tal, estimamos para 2028 uma margem operacional antes de impostos de 15%. Este é um valor que está acima do valor médio da indústria - 11% para retalho online - porque o negócio da empresa não é de retalho puro. A maior margem de lucro da Farfetch está associada ao negócio do tipo third-party, em que os fornecedores utilizam o marketplace da Farfetch para vender diretamente ao cliente final.
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O terceiro fator será estimar o investimento que será necessário aplicar na empresa, de forma a garantir o volume de vendas projetado. Para a Farfetch, o reinvestimento foi estimado assumindo que o rácio sales-to-capital ratio passará de 4 (valor atual) para 2.5 ao longo do período em análise.
Projetando estas estimativas numa análise cash-flow, verifica-se que a empresa necessitará de um capital adicional de 1.535 M€ ao longo dos próximos anos, para suportar o seu crescimento. Assumindo que a Farfetch irá emitir dívida num montante equivalente a 26% do total de capital investido até 2028 (média da indústria), faltarão cerca de 1.000 M€ de financiamento para completar os 1.535 M€ atrás mencionados, o que deverá ser obtido através de emissão de ações. Interessa realçar que um cenário real de emissão de ações não afeta a avaliação resultante da análise cash-flow, já que o efeito de diliuição das ações está já subentendido nos valores negativos de Free Cash Flow to Firm considerados no modelo.
O valor das ações obtidos na análise Cash-Flow é de 11.18 €, recomendando-se a compra de ações até 10.06€ (margem de segurança de 10%).
É de notar que existe o risco de perda total do investimento nas Start-Ups, pelo que se trata de um investimento de alto risco. No entanto, existente também um retorno elevado no cenário mais favorável. E ainda, tratando-se da primeira empresa com ADN português a fazer um IPO numa das mais reconhecidas bolsas do mundo, a Farfetch merece um voto de confiança adicional.
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